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Você fala não pro seu cão?

Atualizado: 3 de fev. de 2022


por Juliana Nishihashi


O uso da palavra não no treinamento tradicional é encarado como parte fundamental do treino. Até porque ela está intimamente ligada às punições positivas, usadas constantemente para barrar comportamentos tidos como errados. Porém, no treinamento positivo, onde focamos principalmente na orientação e direcionamento do cão para atitudes boas para podermos recompensá-lo, o uso do não praticamente não tem vez na comunicação diária. Treinadores e tutores elaboram situações no cotidiano para que possam manejar o cão, a fim de evitar comportamentos indesejados e incentivar comportamentos adequados. Dessa forma, utilizar o não é coisa raríssima, pois o cão tem literalmente dezenas de possibilidades adequadas e não precisa fazer algo indevido que acarrete punição.


Aliás, no treinamento positivo, nunca são utilizadas punições positivas – estímulos aversivos para criar uma associação ruim a determinado comportamento - e raramente são utilizadas punições negativas – quando retiramos o cão ou seu acesso ao comportamento indesejado. No geral, nós treinadores optamos pelo uso de interrupção positiva para interromper comportamentos que não desejamos, e redirecionamos o cão para algo mais adequado. Essa interrupção deve ser feita bem no início do comportamento, e sempre de forma calma e rápida – por exemplo, ao ver o filhote indo até um chinelo para mordê-lo, o tutor pode fazer um som (barulho de beijo ou um “ei!” animado) e assim que o filhote parar o que estava fazendo, o tutor deve chamá-lo, elogiá-lo e redirecionar para outra atividade – morder um ossinho, por exemplo.


Dessa forma, percebemos que falar não para um cão é algo bem distante da realidade dos adeptos do treinamento positivo, simplesmente porque temos uma gama enorme de possibilidades para ensinar comportamentos e cessar situações indesejadas.

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Mais uma vez com a ajuda dos desenhos de Lili Chin, exemplificamos quais são as 4 formas de modificar comportamentos através do condicionamento operante. Ao lado da tradução, mostramos quais as preferências da Cão Com Manteiga nos treinamentos elaborados.

Mas isso não quer dizer que, porque seja raramente usado por nós, o não é palavra proibida na comunicação – pelo menos, dentro da forma que a Cão Com Manteiga trabalha. Só acreditamos que ela não precisa ser usada da forma tradicional: em excesso, de forma impositiva e ameaçadora, ligada a punições aversivas e como primeira opção para modificar comportamentos. Dentro de certos contextos, a única forma que utilizamos a palavra não na comunicação com nossos cães e alunos é associada a punição negativa (P-) – como já mencionei acima, técnica pouco utilizada no treinamento positivo e por nós da Cão Com Manteiga.


Sabemos que as palavras em si não têm nenhum sentido para os cães, a não ser quando propositalmente associadas com algum comportamento, objeto ou pessoa. Assim como “senta” passa a significar “coloque seu bumbum no chão” depois de algumas repetições, a palavra não pode ter outra conotação, se assim associado. E a forma que fazemos isso na comunicação do dia a dia, é associando-a com uma punição negativa. Um exemplo prático que faço com filhotes: incentivo sempre o filhote a morder e brincar com seus brinquedos, e reforço muito esse comportamento. Mas se por acaso o filhotinho se confunde e morde minha mão, eu simplesmente afasto minhas mãos e falo calmamente não. Imediatamente, ofereço um comportamento alternativo – roer outro brinquedo – e elogio o cão. Com o uso, o filhote passa a associar esse não calmo e gentil com uma interrupção, uma impossibilidade de permanecer no comportamento indesejado. Porém, notem que o que ensinará ao filhote o que eu espero que ele faça é orientar e reforçar os comportamentos desejados! O uso do não serve simplesmente para sinalizar a interrupção de algo.


Essa é a única forma de utilizar o não na conversa diária com o cão que usamos dentro das nossas técnicas. Sabemos de diversos colegas que optam por nunca falar essa palavra, e isso está alinhado com as técnicas preferidas destes profissionais. Mas nós percebemos que o uso da palavra não desta forma, calma, natural e sem uso de aversivos, pode ser um detalhe útil na comunicação com alguns cães.


Importante reforçar que de forma alguma estamos incentivando o uso indiscriminado do não na educação dos cães e muito menos no treinamento de cães com graves problemas comportamentais.

Nosso foco, independente do caso, sempre será ensinar, orientar, direcionar e reforçar bons comportamentos. Dessa forma, a incidência de comportamentos a serem “punidos” é praticamente nula.

O intuito desse artigo é trazer uma outra luz sobre o tema – pensamos que o grande problema não é a palavra, e sim o uso errado, associado a dominação, aversivos e a falta de orientação e alternativas aos cães, que ficam reféns das negativas constantes dos tutores.

Percebemos que tutores adeptos do treinamento positivo, muitas vezes se sentem “culpados” por terem falado não para seus cães, ou por terem de alguma forma interrompido comportamentos que não gostaram, achando que isso pode trazer um impacto negativo para seu relacionamento com o cão. Não queremos que tutores dedicados sintam-se mal caso usem o não, num contexto ocasional e não aversivo! Sabemos que no dia a dia às vezes precisamos encerrar algumas situações indesejadas, e uma das formas que podemos fazer isso, além da interrupção positiva, bastante utilizada por nós, é utilizando P- e o aviso do não. Essa é mais uma ferramenta na caixinha, que podemos utilizar dependendo do caso.


Costumamos dizer que, utilizado desta forma que expliquei, o não passa um recado simples para o cão: “Ei, pare com isso que não é bacana, e venha comigo fazer algo mais legal!”. Percebem como não é necessário associar com algo ruim, assustador ou desconfortável? Somente com a interrupção daquela ação específica, por meio da P- (retirada do cão ou do estímulo).


É claro que tudo em excesso é prejudicial, e acredito que esse seja um grande tabu do uso do não. Mesmo se for utilizado com esse viés de interrupção, não pode ser usado em excesso e em todas as situações! Caso isso esteja ocorrendo, provavelmente há uma falha no treinamento e no manejo do cão: está sendo permitido que ele desempenhe comportamentos indesejados, por falta de controle do ambiente, excesso de estímulos, falta de comportamentos alternativos adequados... é preciso readequar a forma de lidar com esse cão para poder voltar a falar mais “sim” do que “não”.


Acreditamos numa forma de educar permeada por comunicação entre cão e tutor. Informar se algo está inadequado pode fazer parte dessa comunicação ocasionalmente. Portanto, um tutor bem informado e com um ótimo relacionamento com seu cão pode fazer essa orientação a seu cão em certas situações sem problemas. O grande diferencial é, como adeptos e fãs incondicionais do treinamento positivo, naturalmente o uso de qualquer negativa fica lá em segundo plano, pois nosso foco e objetivo sempre será orientar, direcionar e recompensar nossos cães, e acabamos até esquecendo de usar aquela palavra... hum, qual era a palavra mesmo?

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